terça-feira, 30 de agosto de 2016

Os benefícios de santificação da Liturgia - Pe. Claudiomar

Palestra proferida para os coralistas do Coral São Boaventura (Campos dos Goytacazes, RJ), dentro das comemorações pelos seus 20 anos de atividade (2001).

OS BENEFÍCIOS DE SANTIFICAÇÃO DA LITURGIA

Pe. Claudiomar Silva Souza, USSJMV.
1.ª Parte – O VALOR DOS CANTORES NA IGREJA
1. Importância da música
        A música tem grande influência na alma e no coração. A piedade verdadeira se expande por si mesma no canto. Nós constatamos que em todos os povos civilizados o canto ocupou um lugar predominante no culto público.
        O mesmo vemos no Antigo Testamento, por exemplo, com o rei Davi e no Novo Testamento, com o exemplo de Nosso Senhor, na última ceia.
        Os Apóstolos, seguindo o exemplo de Jesus, cultivavam o canto e exortavam os fiéis a também fazê-lo: “Entoai entre vós salmos, hinos e cânticos espirituais. Cantai e celebrai de todo coração os louvores do Senhor”. (Ef. 5, 19)
        Daí já podemos ver o valor que a Igreja deu à música em todos os tempos:
  • Vemos os monges cantando os louvores divinos nos mosteiros;
  • Vemos S. Ambrósio (séc. IV) cantando o Ofício Divino em sua Catedral, o que muito edificou S. Agostinho;
  • Vemos S. Gregório Magno (séc. V-VI) fundando as Schola Cantorum para o aprimoramento e conservação do canto litúrgico.
        Assim, nas grandes Basílicas e nas Catedrais da Antigüidade e da Idade Média, vemos as cerimônias solenizadas pelo canto.
2. A música como parte da Liturgia – Função clerical
        Assim escreve, S. Pio X em seu Motu Proprio sobre a música sacra (em 22/11/1903): “A música sacra, como parte integrante da liturgia solene, participa do seu fim geral, que é a glória de Deus e a santificação e edificação dos fiéis. Ela contribui para aumentar a beleza e o esplendor das cerimônias”.
        E por isso, por seu alto papel, enquanto parte da Liturgia, é que a música litúrgica foi entregue pela Igreja ao clero. É de tal modo um ofício clerical, que no rito oriental existe a ordem menor de cantor, e nos tempos de esplendor, as Schola Cantorum eram formadas por clérigos, que cantavam oficialmente, desempenhando um verdadeiro ofício litúrgico.
3. Os corais leigos
        Porém, dada a grande extensão da Igreja e a escassez de clero (no mundo atual), de alguns séculos para cá, foram-se criando corais formados de fiéis, com a finalidade de compensar a falta dos corais litúrgicos formados somente por clérigos.
        Assim, senhoras e senhores, já podem ver a sua grande missão, o valor do papel que realizam na Paróquia.
        E em uma missão tão sublime traz consigo sublimes exigências. Diz S. Pio X: “Portanto não se admitam a tomar parte dos corais na igreja a não ser pessoas de reconhecida piedade e honestidade de vida, as quais, por seu porte modesto e devoto durante as funções litúrgicas, se mostrem dignos do santo ofício que desempenham”(Motu Proprio Tra le solicitudine, de 22/11/1903)
2.ª Parte – A LITURGIA, MEIO DE SANTIFICAÇÃO
        Assim, vemos que os cantores devem ser bons cristãos, de vida exemplar e piedosa. E ninguém, como as senhoras e os senhores, têm à mão um meio mais fácil para o crescimento na piedade, para a própria santificação: esse meio é a grande participação que o coral tem na liturgia.
        A liturgia tem uma dupla finalidade: a primeira, e principal, é a glorificação de Deus; a segunda, subordinada à primeira, é a santificação dos fiéis.
        E a liturgia desempenha sua obra de santificação de dois modos:
        a) enquanto que, por meio do ano litúrgico, nos reproduz a vida de Nosso Senhor, que é o nosso exemplo de santidade: “Exemplum dedi vobis...” (ver texto JESUS CRISTO EM SEUS MISTÉRIOS anexo abaixo)
        b) E, sobretudo, enquanto nos aplica as graças próprias de cada mistério. (ver texto JESUS CRISTO, VIDA DA ALMA anexo abaixo)
        E, as senhoras e os senhores, têm a graça de um contato íntimo e repetido com a liturgia. Daí a importância de buscar conhecer o texto litúrgico e sua tradução. Esses textos os conduzirão a penetrar no intimo do Mistério ou festa celebrada, por exemplo, a Missa dos defuntos, o santo Natal, Sexta-feira santa, etc.
4. CONCLUSÃO
        Busquemos aproveitar essa graça tão grande, esse oficio tão sublime, e aproveitemos ao máximo a liturgia como meio de santificação e união com Deus.
O que é cantar os louvores de Deus na terra, senão um oficio que, junto com os anjos e santos, desempenharemos para sempre no Céu?
Bibliografia
1) BAUMER, Snitbert, OSB. Histoire du breviaire
2) HAUP, Ambrosio. Manual liturgico
3) MARMION, Columba, OSB. Jesus Cristo nos seus mistérios
4) MARMION, Columba, OSB. Jesus Cristo: vida da alma.
Extraído do antigo site do Coral São Boaventura (de Campos-RJ).
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ANEXOS
OS EXEMPLOS DE NOSSO SENHOR PELA LITURGIA
Jesus cristo em seus Mistérios
Sabeis que é sobretudo pela Liturgia que a Igreja a alma dos seus filhos, de modo a torná-los semelhantes a Jesus e realizar assim “aquela cópia de Cristo que é a forma de nossa predestinação” (Rom. 7,29).
Guiada pelo Espírito Santo, que é o próprio Espírito de Jesus, a Igreja desenrola todos os anos, aos olhos de seus filhos, do Natal à Ascensão, o ciclo completo dos mistérios de Cristo, ora numa forma sumária, ora na sua ordem exatamente cronológica, como durante a semana santa e tempo pascal. Assim faz reviver, não de qualquer modo, mas numa representação animada e viva, cada um dos mistérios do seu divino Esposo; faz-nos percorrer cada uma das fases da Sua vida. Se nos deixarmos conduzir por ela, infalivelmente chegaremos a conhecer os mistérios de Jesus e sobretudo penetrar os sentimentos do Seu divino Coração. E porque?
A Igreja, que conhece o segredo do seu Esposo, destaca do Evangelho as páginas que melhor põem em relevo cada um dos Seus mistérios; depois, com uma arte perfeita, ilustra-os com trechos dos Salmos, das Profecias, das Epístolas de S. Paulo e dos outros Apóstolos, com citações dos antigos Padres. Coloca assim numa luz mais viva, mais abundante, os ensinamentos do divino Mestre, os pormenores da sua vida,  a medula dos Seus mistérios.
Ao mesmo tempo, pela escolha das citações dos livros santos e dos autores sagrados, pelas aspirações que nos sugere, pelo seu simbolismo e seus ritos, desperta em nossas almas a atitude requerida pelo sentido dos mistérios, faz brotar em nossos corações as disposições necessárias para que assimilemos ao máximo o fruto espiritual de cada um deles.
(MARMION, Columba, OSB, in Jesus Cristo nos Seus Mistérios . p. 25-26.
Edições Ora & Labora. Porto, 1958)
A CONEXÃO DA LITURGIA E DOS MISTÉRIOS DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO
Jesus Cristo, vida da alma
Os mistérios de Cristo foram primeiramente vividos por Ele, mas para podermos, também nós, vive-los em união com Ele. Como? Inspirando-nos no seu espírito, apropriando-nos a sua virtude, para que, vivendo deles, nos assemelhemos a Jesus Cristo.
É certo que Jesus agora vive glorioso no céu; a sua vida terrestre, no seu curso físico e na sua forma exterior, durou, apenas, trinta e três anos; mas a virtude de cada um desses mistérios é infinita e permanece inesgotável. Quando os celebramos na santa Liturgia, recebemos, na medida da nossa fé, as mesmas graças que se tivéssemos vivido outrora com Nosso Senhor, e assistido a todos os seus mistérios. O autor desses mistérios foi o Verbo Encarnado. Como vos disse, Jesus Cristo, pela Encarnação, associou toda a humanidade aos seus mistérios divinos, e mereceu, para todos os seus irmãos, a graça que lhe aprouver ligar a esses mistérios. E é na sus celebração pela Igreja, à qual encarregou de continuar a sua missão neste mundo, que Jesus Cristo, no decorrer dos séculos, comunica às almas fiéis a participação da graça que esses mistérios enceram. Eles são, como diz S. Agostinho, o tipo da vida cristão que devemos viver, na qualidade de discípulos de Jesus.
Por exemplo, o Natal. – “Adorando o nascimento do nosso Salvador, diz S. Leão, sucede que e a nossa própria imagem que celebramos. Com efeito, esta geração temporal de Cristo é a fonte do povo cristão; e o nascimento do chefe é ao mesmo tempo o de seu corpo místico. Todo homem, em qualquer parte do mundo que habite, acha, neste mistério, um renascimento em Cristo (Sermão IV In Nativitate Domini). O Natal traz, cada ano, à alma que celebra com fé este mistério – pois é pela fé primeiramente, e depois pela comunhão eucarística, que entramos em contato com os mistérios de Cristo, - uma graça de renovação interior, que aumenta o grau da sua participação na filiação divina em Jesus Cristo.
O mesmo se dá com os outros mistérios. A celebração da Quaresma, da Paixão e da Morte de Jesus durante a Semana Santa, traz consigo uma graça de“morte para o pecado”, que nos auxilia a destruir cada vez mais em nós o pecado, o apego ao pecado e à criatura. Porque, diz explicitamente S. Paulo, Jesus Cristo fez-nos morrer e sepultou-nos consigo. Si unus mortuus est, ergo omnes mortui sunt... Consepulti enim sumus cum illo (Rom. 6, 4). Isto em direito e em princípio para todos; mas a aplicação faz-se no decorrer dos séculos, a cada alma, pela parte que toma na morte de Cristo, principalmente durante a época em que a Igreja a recorda.
Do mesmo modo, na Páscoa, quando cantamos a glória de Cristo saindo do túmulo, vitorioso da morte, achamos na participação desse mistério, uma graça de vida e de liberdade espirituais. Deus, disse S. Paulo, ressuscita-nos com Cristo. CONresuscitavit nos (Ef. 2, 6): e diz ainda, falando da graça peculiar a esse mistério: Si CONsurrexistis cum Christo, quae sursum sunt quaerite... non quae super terram – Se ressuscitastes com Cristo, procurai e saboreai, não as coisas da terra, as quais, sendo criadas, contêm o gérmen da corrupção e da morte, mas as coisas do alto, que vos conduzem à vida eterna (Rom. 6, 4) –: UT QUOMODO CHRISTUS surrexit a mortuis per gloriam Patris ITA ET NOS in novitate vitae ambulemus – Com Ele fomos sepultados pelo batismo na morte para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos para a glória do Pai, assim também andemos em novidade de vida (Rom. 6, 4).
Depois de nos Ter associado à sua vida de ressuscitado, Jesus Cristo faz-nos participar do mistério da sua Ascensão. E qual é a graça especial deste mistério? S. Paulo responde-nos: Deus... CONsedere fecit nos in coelestibus in Chisto Jesu – Deus... nos ressuscitou com ele e nos sentou nos céus em Cristo Jesus (Ef. 2, 4 e 6). O grande Apóstolo que com todos esses exemplos ilustra admiravelmente a exposição, que tanto tem a peito, da nossa união com Jesus Cristo como membros do seu corpo místico, diz-nos, em termos muito explícitos, que “Deus nos fez sentar com Cristo no reino dos céus”. Por isso, escrevia um autor antigo: “Enquanto estamos neste mundo, acompanhemos Jesus ao céu, pela fé e pelo amor, para que O possamos seguir na realidade, no dia designado pelas promessas eternas (sermão falsamente atribuído a S. Agostinho, mas, evidentemente, com sua inspiração. É lido no Breviário, no 2.º Noturno da Oitava da Ascensão). Não é, na verdade, o que a Igreja nos incita a pedir na Oração da festa da AscensãoUt qui Redeptorem nostrum in coelos ascendisse credimus, ipsi quoque mente in coelestibus habitemus – Assim como cremos que o vosso Unigênito, nosso Redentor, subiu ao céu neste dia, assim também nós em espírito habitemos no céu.
Assim, ano a ano, a Igreja faz passar diante dos nossos olhos a representação dos acontecimentos que marcaram a vida terrestre do seu Esposo. Faz-nos, primeiramente, contemplar esses mistérios; e, cada ano, é uma nova luz que nos ilumina; descobre-nos os sentimentos do Coração de Cristo, e, cada ano, penetramos mais nas disposições interiores de Jesus; faz reviver em nós estes mistérios do nosso Divino chefe; apoia as nossas súplicas, para que obtenhamos a graça especial, própria de cada um desses mistérios vividos por Cristo; e assim adiantamos, pela fé e pelo amor, pela imitação do nosso modelo divino, posto incessantemente sob os nossos olhares, naquela transformação sobrenatural que é o termo da nossa união com Jesus: Vivo ego, jam non ego, vivit vero in me Christus -  Eu vivo, mas já não sou eu, é Cristo que vive em mim(Gal. 2, 20). Não é isto a santidade real e a verdadeira forma da nossa predestinação divina – ser semelhantes ao Filho muito amado, que a sua vida se torne a nossa?
(MARMION, Columba, OSB, in Jesus Cristo, vida da alma. p. 405-408.
Edições Ora & Labora. Porto, 1961)

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